sábado, 25 de fevereiro de 2012

Sopa bem-me-sabe


Do alto dos seus 6 anos de idade (na verdade, 6 anos, 3 meses e 14 dias), Carlota permitiu-se um sentimento de compaixão para com o irmão mais novo, Bernardo.
Estava sentada à mesa, já tinha almoçado e agora observava o afã da mãe, enquanto tentava que Bernardo, muito bem sentadinho na sua cadeira, comesse a sopa.
“Vá lá, Bernardo” a mãe dizia “abre a boquinha para o avião aterrar. Aqui vai ele” e logo a mãe imitava o barulho de um motor e fazia os mais variados movimentos com a colher, tendo sempre o cuidado de não a entornar.
Mas a boca de Bernardo teimava em ficar fechada.
“Bernardo” dizia a mãe, com infinita paciência “Vá, abre a boquinha. Olha que o aviãozinho quer entrar para descansar”.
Mas nada parecia resultar. Bernardo simplesmente não abria a boca.
“Oh filho” exclamava a mãe “assim não pode ser. Vá, vá lá, abre lá essa boquinha linda para a mamã ver…” Mas não, nem mesmo assim.
Carlota, ao assistir àquela cena toda, compadeceu-se mesmo do irmão. Ele podia ser uma autêntica peste, mas Carlota bem sabia que aquela colher não trazia nada de… bom. Nunca tinha trazido.
Aproveitando uma pausa da mãe, Carlota foi célere: foi à gaveta onde estavam os talheres e tirou de lá uma colher muito especial.
Rapidamente chegou perto do irmão e, com um ar solene, disse-lhe: “Bernardo, estás a ver esta colher? É mágica. Com esta colher podes comer todas as sopas, que todas te vão saber ao que tu quiseres: a batatas fritas, a mousse de chocolate… Ao que tu quiseres, percebes?... Agora, lembra-te: é segredo, o nosso segredo. Não podes dizer nada. Prometes?...”
Bernardo só conseguiu olhar para a irmã, muito sério.
“Chiu” continuou Carlota “A mãe vem aí. Agora, lembra-te do nosso segredo”
Carlota só teve tempo de trocar as colheres e de se ir sentar no seu lugar.
“Pronto, meu querido” a mãe começou “já cá estou. Pronto para o aviãozinho? Cá vai ele… Agora, só tens que abrir essa boquinha linda…”
Carlota ficou na expectativa, à medida que a colher se ia aproximando da boca de Bernardo. Iria ele abrir a boca? Será que ele a tinha percebido?

A boca abriu.
A colher entrou.
A mãe ficou muito feliz. “Meu querido. Muitos parabéns. Esta sopa é muito boa, não é?”
Mas Carlota sabia a verdade.



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