Claudina estava furiosa,
positivamente furiosa. Ou negativamente, pois a vontade dela era torcer o
pescoço de Floriano, assim como se faz às galinhas.
Já era a terceira vez que
ele repetia a gracinha.
Por mais respeito que
Claudina tivesse pela actividade de Floriano – e ela tinha, muito mesmo –,
aquilo era algo que qualquer noivo que se prezasse nunca que nunca se atreveria
a fazer à sua futura esposa.
Deixá-la em pleno altar…
Sim, sim, em pleno altar.
Até parecia de propósito…
Estavam já todos na igreja e só faltava dizer o “sim”, quando aquela maldita
sirene tocava… Era tiro e queda, nunca falhava…
E ele lá ia, todo lampeiro
e sem se atrapalhar, pois como ele dizia, uma vez bombeiro, sempre bombeiro…
É claro que ele não tinha
problemas alguns em abandonar a cerimónia do casamento, pois então, como é que
ele podia?... Não era ele que tinha que ali ficar a pedir desculpa a todos pelo
sucedido. Era ela.
E agora iam casar outra
vez, ou melhor, tentar casar.
Seria desta?...
Este era o pensamento
predominante de todos aqueles que iriam, uma vez mais, à celebração.
Sim, pois no mais íntimo
de si, bem lá no fundo, Claudina sabia que as pessoas já não faziam questão de
ir ao casamento dela com Floriano para lhes desejar felicidades, não, isso
tinha acontecido na primeira vez, quando muito, também na segunda. Não, agora
as pessoas iam movidas pela curiosidade: seria desta que eles casavam?... E a
sirene, ficaria muda e queda?...
Parva era ela em aceitar,
em consentir toda aquela situação – ridícula, pois então… Se fosse outra,
Claudina não duvidava, já tinha mandado o noivo às malvas. E aí ela queria ver,
como é que o Floriano se arranjava… Sim, porque ela tinha a certeza: ele só
fazia o que fazia porque sabia que ela primeiro barafustava, ralhava, mas no
fim aceitava.
Até as empregadas da loja
de vestidos de noiva já se divertiam, à grande e à francesa, com a situação:
pela frente eram todas salamaleques (pudera, aquilo para elas era um maná), mas
por trás, Claudina sabia, eram só risadas de troça.
Aquela situação podia
facilmente ser evitada: bastava levar sempre o mesmo vestido: afinal, ele nunca
tinha servido o seu propósito final: o casamento. Claudina e Floriano nunca
tinham casado. Mas não. Ora não se dizia que dava azar o noivo ver o vestido da
noiva antes do casamento?... Pois bem, Claudina não ia correr também esse
risco.
Em frente ao espelho, na
prova final do vestido de noiva – o quarto que ela ia usar para entrar dentro
da igreja –, no meio de muitos elogios e bajulações, subitamente Claudina teve
uma ideia. E sorriu. Porque era desta que ia casar. Definitivamente.
*
Na véspera do seu
casamento, Floriano estava em casa, muito bem instalado a ler o jornal, quando,
nas páginas centrais, se deparou com este anúncio:
A
TODOS OS QUE POSSAM TER ALGUM
INTERESSE
PELA FELICIDADE ALHEIA
Solicita-se
da forma mais encarecida que,
no
dia de amanhã, não provoquem
qualquer
acção passível da intervenção
dos
Soldados da Paz, por motivo de
contracção
de matrimónio de um
elemento
dos já citados
Certos
da melhor compreensão, desde já
apresentamos
os nossos mais sentidos
agradecimentos
A
noiva, a família,
os
amigos e todos os
restantes
convidados
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